O Brasil é viável?

                                                                          

Joaquim Francisco de Carvalho (*)

O Brasil tem grandes extensões de terras férteis e um clima muito favorável para a agricultura. Suas reservas de minérios de valor estratégico são das maiores do planeta e as fontes renováveis de energia colocam o país em posição privilegiada.

Antes da desindustrialização promovida a partir de 2003, a indústria brasileira era diversificada e integrada e o país tinha estabelecimentos industriais detentores do certificado de qualidade ISO 9000 em maior número do que a Argentina, Uruguai e Chile somados.

Em 2014, o PIB brasileiro foi estimado pelo IBGE em cerca de 1,2 trilhão de reais, o que situava a economia do país entre as 7 maiores do mundo.

Contudo, naquele mesmo ano, o PNUD (programa da ONU para o desenvolvimento) colocou o Brasil em 75º lugar numa lista de 177 países classificados pelo IDH (índice de qualidade de vida). Nessa lista, o Brasil fica em posição inferior à de países como Cuba, Tonga, Panamá e Malásia.

Nos últimos três anos a economia brasileira definhou, o país desindustrializou-se e a qualidade de vida piorou a ponto de se refletir nos cada vez mais frequentes episódios de guerrilha urbana a que temos assistido. Não é exagerado dizer que o Brasil tem-se afundado ainda mais num abismo de índole ética, econômica e social.

Para escapar desse abismo devemos, antes de tudo, aceitar a triste realidade e reconhecer que o país tem sido governado por políticos incapazes e corruptos – e que, com políticos assim, nenhum será viável. Jamais!

Refiro-me, aqui, à grande maioria dos políticos, não importa de que orientação partidária, se é que no Brasil de hoje existe alguma orientação partidária, que não seja a de mesquinhos interesses particulares e paroquiais.

Acredito que a causa primeira do atraso brasileiro é a deficiência do ensino em níveis básico e médio, que deságua na pobreza cívica, moral e cultural, manifestada na má qualidade dos políticos e no despreparo dos eleitores para escolher bons representantes.

Tal situação é especialmente inquietante porque tem a dinâmica de um círculo vicioso, uma vez que o ensino depende de programas elaborados no Ministério da Educação e de orçamentos aprovados pelo Congresso, ficando, portanto, à mercê de políticos quase sempre desqualificados para as funções que exercem.

Despreparados para lidar com as grandes questões da sociedade e da economia, os políticos tratam prioritariamente de seus interesses particulares, que consistem em assegurar a própria sobrevivência política, para garantir a afluência de seus familiares e vantagens para os seus pequenos mundos. 

Então, com o objetivo de se enraizarem no centro do poder (Brasília) partem para fazer o que, impropriamente, chamam de articulação política, o que não raro significa criação de partidos de aluguel, para receber polpudas verbas do Fundo Partidário e nada realizar que seja de interesse para o país.

E pior, apelam para a torpe barganha conhecida como toma lá, dá cá que, em última análise, está na origem de medidas despudoradamente tomadas em benefício próprio, como esse aumento salarial que acabam de propor, que custará cerca de R$ 60 bilhões aos cofres públicos.

Cada partido de aluguel desses sempre tem no parlamento pelo menos um representante pronto a vender seu voto, contribuindo para desvirtuar o papel do Congresso e desfigurar a democracia.

O fato é que o Brasil não se desenvolverá enquanto o Poder Legislativo não for capaz de entender a realidade brasileira, a fim de formular leis baseadas em projetos do Poder Executivo, visando à definição de uma verdadeira política de desenvolvimento nacional, com objetivos setoriais coerentes e realistas, a serem buscados – nos casos de serviços públicos (eletricidade, transportes e comunicações, abastecimento de água etc.), por parcerias público-privadas e – para a produção de bens de capital e de consumo; e serviços pessoais – por empresas privadas, apoiadas pelo governo e obedecendo a rigorosos critérios de qualidade e competitividade.

É desnecessário assinalar que nada disso deve depender de propinas, nem do descarado toma lá, Dá cá, usual em Brasília.

Afora um pequeno grupo de parlamentares dignos e diligentes, a Câmara é dominada por um Centrão, submetido a um sodalício de malfeitores, que até recentemente eram chefiados por um psicopata cínico e frio, que se tornou célebre por sua expertise nos ramos da extorsão de propinas, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e ocultação de patrimônio.

Ao que se diz, o poder desse delinquente vinha de um sórdido jogo de chantagens, em que ele sabia (e sabe) tudo sobre os políticos de Brasília – e estes sabem que ele sabe tudo a seu respeito. Assim, foi só depois de oito meses de manobras ignóbeis promovidas pela tropa de choque desse chantagista que o Comitê de Ética da Câmara aprovou a cassação de seu mandato.

Entretanto, misteriosamente, a sua influência em Brasília permanece alta, inclusive junto à Presidência da República, pelo que se depreende do fato de que ele mantém como presidente interino da Câmara um deputado insignificante, despreparado e mesmo grotesco. E, ainda, colocou na liderança do governo naquela casa um réu em três ações penais – e acusado em outras tantas, sendo uma por tentativa de assassinato.

Pois são esses biltres que, ao serem pilhados em suas patranhas, sempre responsabilizam a “imprensa golpista", como eles costumam chamar as vozes de qualquer oposição...

Ora, é óbvio que partidos de aluguel, tropas de choque e políticos alienados, alguns; ou primitivos e embusteiros, quase todos – como aqueles que, em burlesca sessão da Câmara, votaram "sim" pela destituição da presidente, nunca entenderão nada nem proporão leis que não sejam do mesquinho e imediato interesse de seus pequenos mundos.

De fato, naquela sessão, pouquíssimos foram os deputados que votaram com base em argumentação objetiva e convincente. A esmagadora maioria invocou "argumentos" tais como "sim, pela honestidade do meu pai e do meu avô" ou "sim, pela felicidade do meu neto, que vai nascer daqui a um mês", ou, ainda, "sim, pelo povo da minha (cidadezinha que ninguém conhece)" etc. etc. Nenhum dos votantes parece ter percebido que esses "argumentos" nada tinham a ver com o objeto da votação, podendo ser usados para "aprovar" ou "desaprovar" qualquer coisa...

E, como numa ópera bufa, poucos dias depois daquele ridículo espetáculo, soube-se que o pai do deputado que se tinha vangloriado da "honestidade de seu pai" acabava de ser preso em Minas Gerais, acusado de cobrar uma propina de um milhão e meio de reais, quando foi secretário do governo do senhor Anastasia!

Quanto ao Poder Executivo, numa lista de mais de 20 ministros, contam-se nos dedos de uma mão aqueles honrados e competentes. Os outros são leigos e ignaros – ou ostentam prontuários que ficariam melhor num arquivo policial do que numa lista de ministros. Assim, nenhum país poderá ser viável!

Sobra o Poder Judiciário, que vem cumprindo dignamente a sua missão. Talvez esteja aí a chave para a viabilização do Brasil e sua entrada no grupo dos países desenvolvidos.

Para isto, o Supremo Tribunal Federal deveria exercer, em regime de exceção, o seu papel de Corte Constitucional, com poderes acrescidos para atuar no sentido de promover uma reforma constitucional.

A partida para isto seria dada pela cidadania, por meio de uma campanha semelhante à que deu origem à Lei da Ficha Limpa, com uma petição assinada por mais de um milhão de cidadãos e enviada ao STF através da Avaaz.com (comunidade de campanhas online), por exemplo.

Tal iniciativa – uma vez amplamente divulgada pela mídia – poderia levar aquela corte a considerar seriamente a proposta de suspender imediatamente os mandatos de todos os parlamentares fundamentadamente acusados de fraudes, até que o Ministério Público e a Polícia Federal completassem as investigações e o próprio STF os julgasse, para eliminar definitivamente os culpados.

Os que ficassem teriam a responsabilidade de estabelecer normas rigorosas para a quantificação e justa distribuição dos recursos do Fundo Partidário – e de instituir uma cláusula de barreira, para limitar o número de partidos representados no Congresso.

Em seguida, o próprio STF criaria um Grupo de Trabalho formado por alguns (poucos) juristas e cientistas políticos conhecidos e respeitados na Academia.

Este Grupo de Trabalho elaboraria um projeto de reforma constitucional e de leis complementares, voltadas para uma reforma política, incluindo uma nova lei eleitoral.

Tal projeto seria submetido às comissões de constituição e justiça da Câmara e do Senado para pequenos ajustes, respeitando normas e regras previamente estabelecidas pelo STF,  para que se não desfigure – em função de interesses paroquiais, corporativos ou pessoais – o projeto original, preparado pelo Grupo de Trabalho.


(*) Joaquim Francisco de Carvalho é engenheiro, com licenciatura em física, mestre em Energia Nuclear e doutor em Energia.

 http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=11765:2016-06-23-13-48-27&catid=72:imagens-rolantes

(Com o Correio da Cidadania)

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