Abraços, beijos e luta: 300 mil pessoas lembram 30 mil desaparecidos durante ditadura argentina

                                                                            Aline Gatto Boueri / Opera Mundi
            Mar de bandeiras toma a Avenida 9 de Julho na concentração antes da marcha

No dia de outono ensolarado, pessoas de todas as idades marcharam em Buenos Aires para, como todos os 24 de março, pedir justiça às vítimas da ditadura
      
Ainda não eram 14h, hora marcada para o começo da marcha, e os ônibus já não conseguiam chegar à Avenida 9 de Julho, a um quilômetro de distância da Praça de Maio. No dia de outono ensolarado, mães e pais com suas crianças, adolescentes, homens e mulheres de todas as idades desciam a vários pontos de distância de seu destino final e caminhavam rumo à concentração para, como todos os 24 de março, homenagear os desaparecidos pela última ditadura argentina e pedir justiça.

Ao longo da 9 de julho, onde os movimentos sociais se concentravam antes de marchar pela centenária Avenida de Maio, ouvia-se muita percussão, canções de protesto como só os argentinos sabem fazer, inspiradas no rock nacional como as que cantam nos estádios, fumaça, palavras de ordem que saiam de megafones ou à força da garganta.
                                              
E viam-se militantes em colunas pequeninas ou enfileirados sob bandeiras que ocupavam cinco quarteirões. Viam-se famílias que caminhavam enquanto tomavam chimarrão, viam-se abraços, beijos e luta.

A visita do presidente norte-americano, Barack Obama, que manteve agenda bilateral com seu par argentino, Mauricio Macri, nos dias 23 e 24, não passou despercebida. Entre cartazes e pichações que exigem a continuidade dos julgamentos aos responsáveis - civis e militares - pelo terrorismo de Estado da última ditadura, muitos lembravam a cooperação e cumplicidade dos EUA com o regime.

Também lembravam medidas econômicas de austeridade - de ontem e hoje. Com centralidade na marcha, logo atrás dos organismos de direitos humanos vinculados à luta contra a ditadura, sindicatos denunciavam as demissões em massa desde que Macri chegou ao governo, em dezembro de 2015.
                                                       
                                                        Aline Gatto Boueri / Opera Mundi

Cartazes e pichação lembram papel dos EUA e de grandes corporações na ditadura argentina

Pelas ruas laterais e em todas as imediações da Praça de Maio apenas alguns policiais acompanhavam com os olhos a ocupação massiva das ruas por militantes das mais diversas tendências: kirchneristas, trostkistas, anarquistas, movimentos de base, sindicalistas. Não há movimento social ou político na Argentina que se esquive em dizer, ao menos em público, que ditadura “nunca mais”.

Já na Praça de Maio, diante de uma multidão, Avós e Mães da Praça de Maio - Linha Fundadora, H.I.J.O.S. Capital e Familiares de Detidos e Desaparecidos por Razoes Políticas - organismos que costumam fazer uma análise de conjuntura política todos os anos no aniversário do golpe - leram seu comunicado.

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Membros da associação Mães da Praça de Maio marcham pela Avenida de Maio

Sem rodeios, apontaram diretamente ao presidente Mauricio Macri. “Nesses primeiros 100 dias de governo, nossa democracia retrocedeu muito: com decretos de suposta necessidade e urgência violentaram leis e instituições, como a Lei de Serviços de Comunicação Audiovisual e o Congresso Nacional, quando tentou impor juízes à Corte Suprema. A necessidade e a urgência que os apressavam eram as de desarmar um país integrado à Pátria Grande e com um Estado voltado para o povo”, diziam os organismos em um trecho do documento.

(Com Opera Mundi)

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