RSF pede à Dilma medidas concretas para proteção de profissionais de imprensa

                                                                       
Claudia Sanches

A organização Repórteres sem Fronteiras (RSF), com sede em Paris, enviou, na manhã desta segunda-feira, 1º de junho, carta à presidente Dilma Rousseff. A RSF pediu “medidas concretas e eficazes” para proteger os jornalistas, após o assassinato de dois em maio, que se somam a uma longa lista nos últimos anos.

A entidade também cobrou que a luta contra a impunidade que prevaleceu na maioria desses crimes “deve ser uma prioridade” porque sem investigações imparciais que permitam identificar e punir os culpados a situação “continuará sendo precária”.

“O Brasil é o terceiro país mais mortífero da América” para os jornalistas após México e Honduras, com 38 assassinatos relacionados ao exercício da função entre 2000 e o fim de 2014.

A esses casos se somam três deste ano, sendo o último Djalma Santos da Conceição, da rádio “RCA FM”, que foi sequestrado e assassinado no dia 22 de maio em Conceição da Feira, na Bahia. O radialista, alvo de ameaças, cujo corpo apareceu com sinais de tortura, investigava a morte de uma adolescente por traficantes, destacou a organização.

Outro profissional, Evany José Metzker, apareceu decapitado no dia 18 de maio perto de Padre Paraíso, ao nordeste de Minas Gerais, cinco dias após seu desaparecimento. O jornalista, fundador do blog “Coruja do Vale”, que investigava há meses sobre tráfico de drogas e prostituição infantil, tinha denunciado diversos casos de corrupção na região e apontado o envolvimento de autoridades locais.

A Repórteres sem Fronteiras também se referiu à “forte repressão policial” sofrida pelos profissionais que cobriam as manifestações contra a alta do preço do transporte público em São Paulo entre junho de 2013 e julho de 2014, e contra os gastos da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos. No relatório, a ONG lamenta e afirma que é urgente o combate à violência.

— A Associação Brasileira do Jornalismo de Investigação (Abraji) contabilizou 210 ataques contra jornalistas profissionais ou amadores, 38 dos quais durante o Campeonato do Mundo, perpetrados, na sua maioria, pela polícia militar. O cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, da TV-Bandeirantes, pagou com a vida a cobertura das sublevações populares de seis de fevereiro, no Rio de Janeiro. 

Um mês após o seu falecimento, em março de 2014, o relatório do Secretariado dos Direitos Humanos sobre a violência contra os jornalistas recomendava, nomeadamente, a criação de um Observatório sobre a violência contra os jornalistas, em parceria com a Unesco e a federalização dos inquéritos sobre os crimes cometidos contra os jornalistas.

Carta à presidente

"À Exma. Senhora Dilma Roussef

Senhora Presidente,

No momento em que o Brasil acaba de ser palco de dois brutais assassinatos de jornalistas em menos de uma semana, Repórteres Sem Fronteiras, organização internacional de defesa da liberdade de informação, exorta o Brasil a adotar, com a maior brevidade, medidas concretas e eficazes para garantir a proteção dos protagonistas da informação e para lutar contra a impunidade dos crimes contra eles cometidos.

O Brasil é o terceiro país mais mortíferos da América Latina para os jornalistas, só atrás do México e das Honduras, com 38 jornalistas assassinados, entre 2000 e o final de 2014, por causas com relação evidente ou possível com a sua actividade profissional.

Quase todos investigavam temas sensíveis, como o crime organizado, as violações dos direitos humanos, a corrupção ou o tráfico de matérias-primas. Se a presença do crime organizado em algumas regiões torna a cobertura destas matérias particularmente arriscada, a impunidade que prevalece para a maioria destes assassinatos favorece a multiplicação dos actos de violência.

A tendência piorou nestes últimos anos com, pelo menos, dez jornalistas mortos por causas directamente ligadas à sua profissão, em 2012 e 2013; dois em 2014 e já três assassinatos desde o início do ano, em solo brasileiro. Djalma Santos da Conceição, radialista na RCA FM, em Conceição da Feira (Baía), foi raptado e abatido a 22 de maio.

O seu corpo apresenta marcas de tortura. Segundo fontes locais, havia sido vítima de ameaças e conduzia um inquérito sobre o assassinato de uma adolescente por traficantes. A 18 de maio, o jornalista e fundador do blog Coruja do Vale, Evany José Metzker, dado como desaparecido durante cinco dias, foi encontrado decapitado nos arredores de Padre Paraíso, no nordeste do estado de Minas Gerais. Investigava há vários meses o tráfico de droga e a prostituição infantil.

Havia, também, denunciado por várias vezes casos de corrupção na região, revelando a implicação de funcionários locais. No passado dia 4 de março, Gerardo Servian Coronel, jornalista paraguaio da Rádio Ciudad Nueva, foi abatido em Ponta Porã, zona fronteiriça com o Paraguai.

Este agravamento da violência contra jornalistas se manifestou igualmente no quadro das grandes manifestações contra o aumento do preço dos transportes, em São Paulo e contra os gastos com o Campeonato do Mundo e os Jogos Olímpicos. Entre junho de 2013 e julho de 2014, houve uma forte repressão policial sobre os jornalistas locais e estrangeiros que documentavam estas manifestações. Insultos, ameaças, prisões e detenções arbitrárias, agressões e espancamentos multiplicaram-se.

A Associação Brasileira do Jornalismo de Investigação (Abraji) contabilizou 210 ataques contra jornalistas profissionais ou amadores, 38 dos quais durante o Campeonato do Mundo, perpetrados, na sua maioria, pela polícia militar. O jornalista Santiago Ilídio Andrade, cinegrafista da TV-Bandeirantes, pagou com a vida a cobertura das sublevações populares de 6 de fevereiro, no Rio de Janeiro.

Um mês após o seu falecimento, em março de 2014, o relatório do Secretariado dos Direitos Humanos sobre a violência contra os jornalistas recomendava, nomeadamente, a criação de um Observatório sobre a violência contra os jornalistas, em parceria com a Unesco e a federalização dos inquéritos sobre os crimes cometidos contra os jornalistas.

Passado mais de um ano sobre este relatório, estas propostas continuam por implementar. A 20 de maio de 2015, a Comissão Para a Segurança Pública e Para o Combate ao Crime Organizado da Câmara dos Deputados rejeitou um texto que ia no sentido da federalização.

Tendo em conta o nível de violência contra os jornalistas, a implementação das recomendações feitas pelo grupo de trabalho do Secretariado dos Direitos Humanos sobre a segurança dos jornalistas é, mais que nunca, necessária e urgente.

A luta contra a impunidade deve ser uma prioridade. Sem inquéritos independentes, imparciais e aprofundados que permitam encontrar e castigar os culpados destes crimes, a situação dos jornalistas continuará a ser de grande precariedade.

Agradecendo a atenção que dará ao nosso apelo, manifestamos, Senhora Presidente, a expressão da nossa mais elevada consideração.



Christophe Deloire

Secretário Geral
Repórteres Sem Fronteiras"

(Com a Associação Brasileira de Imprensa)

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