A verdadeira derrota de Dilma e do PT

                                                                                                       

Mário Magalhães 

Um observador  interpretou os eventos de ontem na Câmara com alguns pitacos encimados pelo título “A vitória do governo Dilma''.

Somando os votos, que na maioria mantiveram a essência da medida provisória 665, a análise está correta. Afinal, os deputados se pronunciaram de acordo com a vontade do Palácio do Planalto.

Como não se conta a história somente confiando na matemática, minha leitura é inversa.

A presidente da República, que em campanha assegurou que não retiraria direitos dos trabalhadores nem que a vaca tossisse, consagrou uma orientação de segundo mandato que tem como um dos eixos o ataque a conquistas dos mais pobres e de quem vive do suor do trabalho, e não da atividade financeira parasitária.

Houve uma derrota política monumental de quem governa graças ao compromisso de melhorar, e não piorar, a vida dos que mais sofrem com a obscena desigualdade social do Brasil.

Tropeços no Congresso acontecem. A verdadeira derrota é abandonar quem se habituou ao abandono.
Parece suicídio.

Ricos ganham, pobres perdem

Nem a mais inspirada frase ou manobra regimental de prócer oposicionista faz tão mal ao governo Dilma Rousseff quanto as ações do governo Dilma Rousseff.

É preciso exibir muita cara de pau, indigência analítica e desonestidade intelectual para não reconhecer o caráter antissocial das decisões sufragadas ontem por PT, PMDB e outras agremiações.

Em conjunto com a medida provisória 664, as mudanças prejudicam o acesso ao seguro-desemprego, ao abono salarial, a pensões, a auxílio-doença, ao socorro aos pescadores impedidos de trabalhar em nome da justa proteção à natureza.

Ou seja, dificultam a sobrevivência de quem mais sobrevive do que vive.

No momento em que a transferência de renda pública para os bancos se multiplica, com o aumento da taxa de juros. Os balanços ostensivos das grandes casas bancárias contrastam com as garfadas nos assalariados. Os ricos ganham, os pobres perdem.

É legítimo e da democracia, embora injusto e covarde, defender que os trabalhadores paguem a conta da crise.

Porém, constitui fraude edulcorar o arrocho com o verniz de “ajuste''.

CUT denuncia 'traição'

A base de Dilma, inclusive muitos deputados do Partido dos Trabalhadores que ontem votaram contra os trabalhadores, desfilaram pelas ruas em 13 de março.

Uma das bandeiras que mais tremularam naquela jornada convocada pela CUT e outras organizações se opunha às medidas provisórias 664 e 665, classificadas como daninhas aos mais pobres.

Quer dizer que agora as MPs 664 e 665, com um ou outro retoque, passaram a ser positivas para os trabalhadores?

Vale a célebre máxima fernandista “esqueçam o que eu escrevi'' ou disse?


Nem o mais sofisticado malabarismo retórico é capaz de convencer ao sustentar tamanho desvario.
O apelo desfraldado na imagem lá no alto está na página oficial da CUT.

Cuja manchete nesta manhã era  “Deputados traem a classe trabalhadora''.

Alguém considera que, ao se opor à ofensiva antissocial do governo Dilma, a CUT e centrais como a CSP-Conlutas trocaram de lado?

Continuam onde sempre disseram que estão.

PT contradiz programa de TV

A noite na Câmara teve outros contornos sombrios.

Na véspera, em seu programa na TV, o PT divulgara que “tem defendido que não se cortem direitos dos trabalhadores''.

Um dia depois, chancelou tal corte.

Por coincidência, também ontem o Senado regulamentou os direitos dos trabalhadores domésticos. 

Foi na administração Dilma, na primeira quadra, que as empregadas domésticas, categoria associada às heranças da escravidão, obtiveram avanços. O viço do mandato inaugural desbota.

Para atormentar os trabalhadores, o PT de Dilma se associou ao mesmo PMDB que atropelou na Câmara com o projeto de terceirização que configura um imenso golpe nos assalariados e contra o qual Dilma e seu partido se insurgem.

O governo, não sem razão, costuma se queixar de má vontade do jornalismo dominante. Pois ontem o grosso do jornalismo esteve a favor das iniciativas de Dilma e seu ministro Joaquim Levy.

Unidos pelo arrocho contra os mais fracos, arautos do governo vibraram junto com jornalistas e propagandistas radicalmente  oposicionistas.

No plenário da Câmara, parlamentares com inegáveis serviços prestados à cidadania foram xingados por figuras sinistras e pelegos manjados.

O nonsense é que os valentes deputados de outrora se debatiam pela retirada de direitos de quem trabalha.

Panelaço na favela

A desaprovação recorde de Dilma não foi inventada por instituto de pesquisa, como se sabe muito bem nos bastidores do Palácio do Planalto.

A presidente batalhou na campanha com discurso pela esquerda, antes de enviesar pela direita em 2015. Na favela Santa Marta, aqui no Rio, teve morador batendo panela anteontem.

Ao desprezar sua base social, o governo se vê mais sozinho para resistir ao golpismo desvairado dos que recusam a soberania da decisão dos eleitores.

De concessão em concessão, o governo não fica mais forte. Fragiliza-se.

O próximo passo talvez seja ceder maiores fatias do pré-sal. Enganam-se os governantes que pensam que isso saciará certas sedes. Ao contrário, estimulará a gula quem historicamente nunca quis o petróleo sob o controle do Estado.

O Brasil melhorou

É igualmente preciso exibir muita cara de pau, indigência analítica e desonestidade intelectual para não reconhecer que a vida da esmagadora maioria dos brasileiros melhorou de 2003 para cá.

Sim, a distribuição de renda foi excessivamente moderada, houve o mensalão, os lucros pornográficos dos bancos, a indústria definhando, a recusa em distribuir a terra.

Sobre corrupção, que sempre favorece os ricos contra os pobres, é impossível saber se disparou ou o que cresceu foi o combate à roubalheira.

Mas basta olhar para os indicadores de emprego, carteira assinada, crédito, passageiros nos aeroportos, número de universitários, negros nas universidades, miséria e pobreza reduzidas em milhões de brasileiros para perceber a evolução.

O que o governo Dilma Reloaded faz _atenção aos novos números do desemprego_ é ameaçar um patrimônio que não é de Lula, de Dilma do PT e seus aliados. É um patrimônio do Brasil e dos brasileiros.

Quem diz que os deputados, a serviço do Planalto, traíram os trabalhadores não é ninguém com má vontade com o governo.

É a CUT.

A CUT, controlada por petistas, sabota o governo? (Com a Unidade Classista)

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