Importante questionamento abordado por "Opera Mundi"

                                          
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Exposição de latinos em Nova York questiona o que é ser 'americano'



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“A Logo For America [Um logo para América]” (1987), feito pelo artista chileno Alfredo Jaar, questiona o que é ser americano



Thiago Carrapatoso | Nova York -


Mostra fica aberta até outubro no Museu Guggenheim e conta com cerca de 50 obras de artistas de diversas nacionalidades, inclusive brasileiros
      
As telas da Times Square, em Nova York, estão questionando um tema que incomoda muitos imigrantes, mas que pouco tem sido pensado pelos estadunidenses em geral. No mês de agosto, durante três minutos, perto da meia-noite, imagens do mapa dos Estados Unidos e a frase “Isto não é América” são exibidas. Logo depois, elas mudam, e formam o continente inteiro, englobando as Américas do Norte, Central e do Sul, e se lê “América”. Em uma outra tela, se vê a bandeira dos EUA e, mais uma vez, o dizer “Isto não é América”.

O trabalho “A Logo For America [Um logo para América]” (1987), feito pelo artista chileno Alfredo Jaar, questiona a percepção dos cidadãos dos EUA de que apenas aquele país representa o continente inteiro. Não à toa que ainda usamos o termo “americanos”. Jaar, ao criar o trabalho, não está apenas questionando as concepções e nomenclaturas geográficas, mas também a imposição feita pelo império estadunidense sobre os outros países do continente.

Conforme desenvolve Ricardo Ortiz, em seu livro “Cultura Brasileira & Identidade Nacional”, o colonialismo impõe aos países colonizados uma dupla dominação: “É a exploração econômica das matérias-primas e importação de produtos acabados, mas sobretudo dominação cultural.”

A obra de Jaar, pela primeira vez exibida em 1987, é agora revista graças à exposição “Under the Same Sun: Art From Latin America Today [Sob o mesmo sol: arte da América Latina hoje]”, que fica aberta até outubro no Guggenheim de Nova York e conta com cerca de 50 obras de artistas de diversas nacionalidades, inclusive brasileiros.

A exposição, de acordo com a divulgação, “examina a diversidade das recentes respostas criativas às realidades comuns construídas pelas histórias coloniais e modernas, políticas governamentais repressivas, crises econômicas, e desigualdade social, assim como por períodos de desenvolvimento econômico e progresso social.” Em outras palavras, o objetivo é fazer um panorama das respostas feitas por artistas latino-americanos às situações políticas e sociais vividas majoritariamente da década de 1960 para cá.

Sem considerar as discussões que os próprios trabalhos levantam, “Under The Same Sun”, ao usar o termo em seu título, também traz à tona a problemática sobre o que é ser latino-americano atualmente. A área englobada por esta denominação geopolítica envolve não só culturas diferentes, como processos colonizadores totalmente díspares.

Há, dentro do mesmo termo, países que possuem como línguas oficiais o inglês, o espanhol, o português, o criole, o francês, o holandês e tantas outras. Como englobar toda uma produção sobre o mesmo viés? E o que seria uma arte latino-americana? E como o Brasil é representado dentro desta terminologia?

“Isso é um rótulo americano para lidar com uma realidade que é muito complexa”, afirma Sergio Bessa, diretor do departamento curatorial e educacional do Bronx Museum, também em Nova York.

Ao mesmo tempo em que a exposição “Under The Same Sun” acontece no Guggenheim, o Bronx Museum questiona as estruturas arquitetônicas e urbanísticas modernistas com a exposição “Beyond the Supersquare”, organizada por Holly Block e María Inés Rodríguez.

Quatro dos 30 artistas escolhidos fazem parte também da exposição do Guggenheim, incluindo o curador Pablo León de la Barra. “No Brasil, a gente já tem dificuldade de lidar com a herança tripartida: o nativo, o africano e o imigrante.

Essa realidade, no México, envolve várias tribos e civilizações. É a miscigenação. Tem até a tradição no México da pintura de castas, do século XVIII, XIX, que são bem etnográficas, exatas. Algo que que no Brasil não existe. A gente tem nomes para classificar a mesclagem, mas que ninguém usa. Essas complexidades de todos os países da América Latina ficam apagadas por conta deste rótulo”, completa Bessa.
                                                   

"Estátua da Liberdade Deitada" (1979), da argentina Marta Minujín, que também participa da exposição "Under The Same Sun"

O termo é comumente associado ao clima tropical, como também mostra a exposição curada por León de la Barra. Uma das seções que separa a disposição das obras se chama “Tropicologias”, que “reconhecem os efeitos que o clima, a natureza, e a localização possuem na produção cultural, mas também argumentam que ser 'tropical' é muito além do clima ou da geografia”.

Mas até que ponto este termo também não ajuda nesta imposição político-cultural de outro país, como acontece com o termo América Latina? Para Bessa, há uma adoração pelo termo, principalmente em Nova York. “As pessoas aqui adoram a palavra ‘tropical’. É engraçado que o Hélio Oiticica a usou apenas uma vez, com a instalação chamada Tropicália (1967).

Ele deve ter se arrependido amargamente, porque ficou – e muito – pela interpretação do Caetano Veloso e Gilberto Gil. Há uma má leitura. Se acredita que o que aconteceu na música era o mesmo que acontecia nas artes plásticas. Não era. Era totalmente desconectado. Na música, era algo totalmente pop, influenciada pelos Beatles. E nas áreas das artes visuais e literatura, foi algo totalmente diferente.”

A exposição de la Barra ganha créditos por mostrar ao público estadunidense grandes obras feitas por artistas do continente. Mas será que nos enquadramos todos no termo? E por quê? (Com Opera Mundi)

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