“Bomba-relógio” de Edward Snowden

                                                                      
                                      

A sociedade e a estabilidade política estadunidenses continuam sentindo os efeitos do terremoto de informação que há um ano provocou Edward Snowden. O programador de 30 anos de idade, ex-funcionário da CIA e da NSA abriu a Caixa de Pandora: nunca antes na história norte-americana foi exposta tanta roupa suja dos serviços secretos.

Mas o mais importante é que nunca antes um “homem de sistema” contou ao mundo sobre vigilância em tão larga escala, interceptação de dados eletrônicos e invasão da vida de cidadãos comuns, políticos e países inteiros.

Um ano atrás parecia que o escândalo iria abalar as fundações do universo norte-americano. Mas passados 12 meses não houve nenhuma demissão, nenhum caso criminal. Até mesmo ações judiciais levaram a vereditos opostos: uns juízes federais diziam que todos os programas de vigilância de norte-americanos estão de acordo com a Constituição, e outros diziam que violam-na. E mesmo assim não se pode dizer que Snowden apostou seu futuro em vão, diz o jornalista e porta-voz do site WikiLeaks Kristinn Hrafnsson:

“Edward Snowden pode não temer que sua exposição passou sem deixar rastro. Durante este ano, tudo mudou, e as mudanças vão continuar. Primeiro o WikiLeaks lançou uma onda de vazamentos, depois surgiu Snowden. E agora veja como o mundo está mudando, surgem novos denunciantes que publicam mais novos materiais sobre abusos. Assim que a situação está mudando, mas isso leva tempo. Mas em primeiro lugar é preciso explicar à sociedade a situação real, o quão longe foram os serviços especiais. E nisso o papel principal cabe à mídia”.

A mídia norte-americana está ativamente publicando e republicando novas denúncias de Snowden. Mas mesmo aqui está surgindo uma divisão. Muitas mídias pró-governo acreditam que o programador fugitivo sempre não é um herói, mas um traidor. Snowden revelou a todo o mundo os métodos operacionais dos serviços de inteligência dos EUA. Isto significa que os norte-americanos perderam uma das suas vantagens na não declarada, mas de fato há muito vigente guerra cibernética, com todos os seus ataques de hackers, intercepção de dados, introdução de vírus e “bugs” em equipamentos. O ex-funcionário do Departamento de Segurança Interna dos EUA, o procurador Stewart Baker, comentou a situação assim:

“É sempre difícil dizer o quão negativa pode ser a influência de um ou outro vazamento sobre nossas capacidades e fontes de inteligência. Isso depende de que tipo de informação foi tornada pública e de quem está por trás do vazamento. Mas nesta situação podemos definitivamente dizer que foram afetadas as nossas capacidades de espionar, por exemplo, os militantes do Taliban.

Você acha que eles, tendo lido sobre essas revelações, não vão mudar os métodos de comunicação entre si? E, certamente, isso prejudicou as nossas relações com os países que ajudam no trabalho de inteligência e com empresas contratadas. E nós precisaremos de tempo para restaurar essas relações com esforços diplomáticos”.

Segundo muitos analistas políticos, as principais consequências do escândalo com Snowden são de imagem. Quem vai agora levar a sério acusações de ciberespionagem, espionagem de cidadãos, espionagem industrial provenientes dos EUA? Tais tentativas receberão a mesma resposta de qualquer regime, mesmo do mais autoritário: “olhem para si mesmos”. Graças a isso, a imagem dos EUA como líder mundial é nivelada em grande parte, diz o perito do centro analítico da Brookings Institution Bruce Jones:

“As revelações de Snowden, obviamente, não é a primeira, mas uma das principais causas do enfraquecimento da posição dos EUA no cenário mundial. E isso aconteceu no momento de rápidas mudanças na política mundial, da formação de novas alianças e uniões. As ações de Snowden levaram muitos no mundo a reconsiderar seus pontos de vista sobre o papel dos Estados Unidos. Primeiro, os EUA eram vistos como garantidores da segurança de seus aliados. E esta imagem está agora destruída. Em segundo lugar, os Estados Unidos garantiam e continuam garantindo a ordem financeira e o funcionamento do sistema de mercado. E aqui também surgiram perguntas – sera que os EUA podem ser o garante da estabilidade? E, finalmente, a imagem dos Estados Unidos como um país de liberdades civis. Snowden desferiu um golpe contra esta posição também”.

O debate público é, por enquanto, o principal resultado do escândalo provocado por Snowden. Ainda não podemos falar de cessação da vigilância em massa – ordens judiciais não foram canceladas. Além disso, os serviços secretos continuam possuindo capacidades técnicas para invasão da privacidade dos cidadãos. A CIA, a NSA e outras agências recuaram para as sombras, e estão esperando saber para onde soprará o vento.

Mas um dos coautores de toda esta história, o advogado e jornalista Glenn Greenwald, está certo: o próprio fato de que agora em todo o mundo os defensores de direitos humanos por um lado e os governos por outro estão debatendo os limites do permissível é uma conquista.

A atenção à história em torno Snowden e dos serviços de inteligência norte-americanos recentemente diminuiu acentuadamente. A última onda de interesse público surgiu no início de junho – na altura do aniversário do escândalo. Mas Glenn Greenwald, a quem o programador fugitivo deu um disco rígido com milhares de documentos, promete novas revelações escandalosas.

Desta vez, elas vão tocar uma lista específica de pessoas que estavam sendo vigiadas pela inteligência eletrônica dos EUA. Além disso, sabe-se que representantes de Snowden estão negociando com as autoridades sobre um possível acordo para que Snowden possa voltar para casa. Mas os detalhes das negociações por enquanto não são divulgados. Ora ainda é cedo para pôr um ponto final neste escândalo.

Leia mais: http://portuguese.ruvr.ru/news/2014_07_01/Bomba-rel-gio-de-Edward-Snowden-9960/  (Com a Voz da Rússia)

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