Revista Imprensa mostra o futuro do jornalismo com as novas tecnologias

Novas tecnologias prometem grandes 
mudanças na imprensa, dizem jornalistas
                                                            

Lucas Carvalho (*)  
  
Robôs teleguiados, relógios com aplicativos e sistema operacional, óculos de sol e de grau que filmam e acessam a internet, algoritmos dando notícias sobre esportes, terremotos e finanças. Parece a premissa de um filme de ficção científica, mas é um cenário cada vez mais real e próximo do nosso cotidiano. A evolução da tecnologia afeta a maneira como toda a sociedade funciona. Na comunicação e, principalmente, no jornalismo, não é diferente.

Bob Woodward e Carl Bernstein não tinham smartphones ou mesmo um computador com a tecla backspace para produzir as reportagens sobre o escândalo de Watergate, que marcou a história do jornalismo investigativo na década de 1970. Por outro lado, as denúncias de Edward Snowden sobre os esquemas de espionagem do governo dos Estados Unidos - história que, em diferente proporção, impactou profundamente o mundo da comunicação - não teria chegado ao público sem as mais modernas tecnologias de armazenamento de dados. Sequer seriam notícia se não existisse a internet.

Pollyana Ferrari é professora de jornalismo digital e hipermídia na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e autora do recém-lançado livro “No Tempo das Telas”. Na década de 1990, ela atuou como diretora de conteúdo do portal iG. A jornalista estabelece um paralelo com aquela época e os dias de hoje ao relembrar a chegada da primeira câmera digital da equipe, uma Sony Mavica, produzida em 1997.

“A redação do iG tinha uma só [câmera digital], que operava com disquete e era carísima! Para sair com ela, era a maior briga. E ajudava muito, porque senão você tinha que trazer a foto sem ser digital. Então, eu acho que essas novas ferramentas estão na mesma proporção. Nada disso vai revolucionar o jornalismo, mas é um ferramental que nos permite ser mais ágeis”, conta Pollyana.

Na prática

Os óculos inteligentes Google Glass e as aeronaves em pequena escala não-tripuladas, os drones, são algumas das ferramentas que vêm ganhando destaque no noticiário de tecnologia mundo afora. Por mais que estejam cada vez mais próximas de chegar ao mercado, essas tecnologias ainda parecem sumir no horizonte quando se pensa em como elas poderão ser assimiladas pelas redações, especialmente no Brasil.

                                                
                                        Drones vão ganhar espaço na cobertura jornalística

“O Google Glass ainda nem foi lançado e os drones engatinham mundo afora. Portanto, tudo é muito incipiente e é arriscado fazer qualquer previsão neste sentido, principalmente levando em consideração que as tecnologias demoram a chegar ao Brasil e, quando vêm para cá, têm preços abusivos”, afirma o jornalista Marcelo Gripa, editor do portal Olhar Digital.

Para Katia Militello, diretora de redação da revista Info, todo e qualquer avanço na tecnologia deve ser bem-vindo pelos jornalistas. Ela cita como exemplo a reportagem especial “Snow Fall”, publicada no site do The New York Times em 2012. A matéria utiliza uma série de ferramentas multimídia, com vídeos, fotos, animações e infográficos interativos, para falar sobre uma avalanche em Washington, capital dos EUA. A iniciativa foi vencedora de um prêmio Pulitzer.

“A arte de contar boas histórias com precisão e com verdade nunca vai perder o valor, em qualquer que seja a plataforma. Essas novas tecnologias podem ajudar o jornalista a apurar melhor, a mostrar para o leitor a história de uma forma diferente”, diz Katia.

Duas universidades nos Estados Unidos - em Nebraska e Missouri - passaram a oferecer cursos sobre o uso de drones no jornalismo. Na Califórnia, a USC está ensinando seus futuros repórteres a atuar com o Google Glass. Tudo isso sem que, na maior parte do país, o uso dessas tecnologias tenha sido sequer regulamentado.

Para Pollyana, o mais provável é que os “zangões” robóticos sejam utilizados por paparazzi. “Tem uma tendência muito forte para a indústria da fofoca. Coloca o drone lá, não precisa mandar o fotógrafo, e ele pega muito mais coisas indiscretas. Também em coberturas de lugares sem acesso, às vezes em conflito. Isso eu acho muito bom, se o drone preservar a vida do jornalista”.

A internet das coisas

O conceito de “internet das coisas” define a conectividade das pessoas com a internet 24 horas por dia, através dos mais diferentes gadgets. Essa tendência também pode mudar o fluxo e a velocidade com que a informação é transmitida num futuro próximo.

Segundo Pollyana, talvez não seja de maneira benéfica. “Eu acho que a gente não consome informação nessa velocidade. Se a gente voltar lá para a década de 1990, ninguém consumia aquelas partes de ‘Minuto a Minuto’ dos portais. É uma sociedade conectada, mas quanto daquilo é bobagem? Bate-papo no Facebook, Whatsapp…? Eu acho que jornalismo mesmo, informação, não pode ser o tempo todo”.

Para Katia, ainda assim, a “internet das coisas” pode ser útil no trabalho do jornalista. “Isso facilita muito a vida no dia-a-dia. Você tem formas de comunicação que não existiam antes. Imagine como há 20 anos você passava uma matéria? Por telefone, sei lá. Hoje, para você transmitir uma foto ou colocar um vídeo no ar é de qualquer lugar, é muito mais fácil”

Gripa, entretanto, lembra que essa “revolução” nos meios de comunicação ainda tem efeitos imprevisíveis a longo prazo. “Hoje em dia, muitas pessoas aposentaram a comunicação por e-mail e passaram a se falar pelas redes sociais e aplicativos mensageiros. Esta mudança de hábito era inimaginável 15 anos atrás. Penso que o mesmo deve acontecer com as novas tecnologias que estão por vir. Mas, antes de qualquer previsão apocalíptica, vale uma ressalva importante: é sempre o público quem decide o que vai ou não vingar.”

O robô-jornalista

Durante um evento sobre tecnologia nos Estados Unidos em março, o cofundador da Microsoft, Bill Gates, afirmou que, cada vez mais, os humanos tendem a ser substituídos em suas funções por máquinas ou softwares. Na mesma semana, um algoritmo desenvolvido pelo Los Angeles Times produziu a primeira nota no mundo sobre um terremoto que atingiu a Califórnia.

Para Gripa, a automatização profissional é uma tendência irreversível, mas o componente humano ainda terá espaço nesse novo mercado de trabalho. “Acredito que uma máquina seja perfeitamente capaz de organizar informações de acordo com sua relevância e entregá-las ao público de forma pasteurizada, como já acontece por aí. O mesmo não se pode dizer sobre a capacidade de contar boas histórias. Este jornalismo sobreviverá”, afirma.

Pollyana acredita ser muito difícil que os robôs venham a competir com os seres humanos no jornalismo. Segundo a professora, esse tipo de tecnologia também pode ser favorável ao trabalho dos repórteres. “Eu acho que a gente vai conviver com isso. O jornalista para o digital vai ter que ser o gestor de tudo isso. Você pode até ser furado pelo robô, mas a consolidação da história, os melhores links, o melhor olhar… eu acho que o humano é imbatível.”

Katia finaliza apontando o que o robô ainda não consegue fazer: interpretar uma informação além da objetividade dos números e ser capaz de estabelecer um contato mais subjetivo com o público. “As máquinas não conseguem ainda discernir as várias facetas de uma notícia. Você pode contar uma história de "n" maneiras. Eu acho que só o nosso cérebro consegue fazer isso, criar coisas diferentes. Por enquanto, as máquinas não devem nos substituir. No futuro, em algumas posições, quem sabe?”, finaliza.

* Com supervisão de Vanessa Gonçalves (Com o Portal Imprensa e grifos meus, José Carlos Alexandre) Créditos das imagens:Divulgação

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