Arquivos da Ditadura resgatam história de líder comunista alagoano (Com matéria como esta lembro-me da riqueza dos depoimentos de familiares de mineiros de Nova Lima, vítimas do capitalismo, mesmo antes da ditadura, como os 51 demitidos da Morro Velho acusados de terroristas, quando este termo ainda era inusual no linguajar internacional. Eram os mais atuantes trabalhadores entre os mais valentes mineiros de Nova Lima e Raposos. A Comissão Estadual da Verdade está a dever ao Brasil e à América Latina esta)


             


                                             

Encontro de Miranda com o 1º presidente da China comunista, Mao Tse TungMao Tse Tung (Crédito: Arquivo da família)


Erik Maia / Gilson Monteiro 


Os trabalhos das Comissões da Verdade (CV) em todo o país têm ajudado a esclarecer, ou ainda mudar, histórias de pessoas que durante 21 anos combateram o período mais sombrio do Brasil, os anos de chumbo, a Ditadura Militar.

Em Alagoas, depois de Manoel Lisboa, outro alagoano que deve ter sua história reconstruída é o jornalista e advogado Jayme Miranda. A importância do líder comunista para as páginas da história alagoana é tão grande que o jornalista dá nome à Comissão local, chamada de Comissão Estadual da Memória e Verdade Jayme Miranda.

O esforço conjunto entre familiares, pesquisadores e comissões instaladas Brasil a fora tem conseguido informações valiosas que atestam histórias, que embora já tenham sido escritas, eram apenas relatos testemunhais.

Recentemente, uma das histórias contadas sobre Miranda ganhou provas em imagens. O pesquisador da ditadura Alberto Santos, encontrou fotos de uma visita que o líder comunista fez ao então 1º presidente da China comunista, Mao Tse Tung.  .

Segundo o neto de Jayme Miranda, Thyago Miranda, relatou ao TNH1, a família não tinha registro do encontro, apenas o relato descrito em um livro de 1979. “O encontro aconteceu em 1963, e pelo que contam ele conversou com Mao em chinês, já que era poliglota.

Nós não tínhamos essas fotos, embora conhecêssemos a história do encontro, mas graças ao pesquisador Alberto Santos, agora temos como provar que meu avô, o terceiro homem na hierarquia do Partido Comunista do Brasil, se encontrou com o líder chinês”, comemora o neto.

Ele conta que ainda há registro de encontros entre Jayme e os líderes da revolução na América Latina, Ernesto Che Guevara e Fidel Castro, mas lamenta que ainda não tenha conseguido registros fotográficos dos encontros.

“O mesmo livro que descreve o encontro com Mao, descreve o encontro dele com Fidel e Che, então temos esperanças de que com a abertura dos arquivos da ditadura, alguns desses relatos sejam documentados com imagens, o que mostra o quanto influente foi nosso avô”, diz Thyago, orgulhoso

Outra forma que vem ajudando a perpetuar a verdadeira história do jornalista Jayme Miranda é o registro em documentários. Neste momento existem dois documentários publicados, “Jayme Miranda Vida E Luta”, produzido  pelo Instituto Zumbi dos Palmares em 2005, aqui em Alagoas, e “Uma Voz do Povo”, produzido no Rio de Janeiro. 

Além desse, o também jornalista João Marcos, está produzindo um terceiro, aqui em Alagoas, que deve associar as recentes descobertas à vida do líder comunista. Contudo, Miranda faz uma confidência. Ele sonha em tornar a história de seu avô em filme biográfico. “Quem sabe um dia a gente consegue?”, torce.

DOCUMENTÁRIO Jayme Miranda Vida e Luta

Morte tem três versões

Mesmo sendo considerado morto desde 1975, a família de Miranda ainda carrega uma dura realidade, não há definição sobre como ele morreu ou onde seus restos mortais foram parar, já que, mesmo tantos anos após o fim da ditadura seu corpo é dado como desaparecido. gora, com a abertura dos documentos do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi), a família espera conseguir alterar a história oficial.

 “Existem três versões para a sua morte. A que ele foi jogado de um havia, a 200 milhas da costa, a de que ele foi incinerado em uma fornalha de uma usina de açúcar no estado do Rio de Janeiro, esta versão do delegado Cláudio Guerra, e a última, que para nós é a mais importante já que é da última testemunha ainda viva, é a que conta que ele foi morto, esquartejado e teve seus restos jogados em um rio, esta versão de um ex-sargento do Doi-Codi, Marival Chaves, que ainda está vivo e pode dizer onde o corpo foi deixado”, revela.

Com base nas novas informações a família de Jayme Miranda diz que pretende reescrever um trecho da história, dando a verdadeira versão para o crime,  a de que Miranda foi assassinado pelo regime militar, mas disse que a família não pretende pedir reconstituição do crime. “Ainda é muito doloroso para o meu pai e para minha tia, que perderam meu avô quando ainda eram crianças”, emociona-se.

Depoimento da esposa

Recentemente, em novembro, a viúva de Jayme Miranda, senhora Elza Rocha de Miranda, foi ouvida pela Comissão da Verdade  disse que seu marido desapareceu em 5 de fevereiro de 1975 na cidade do Rio de Janeiro. “Todos ficamos muito apreensivos porque foi num dia em que estávamos com os sobrinhos de Maceió e ele (Jaime) me pediu para fazer um jantar para os meninos.

Nós esperamos por ele, que não apareceu. Aquilo foi muito deprimente para todo mundo. Ficamos muitos tristes. Naquele mesmo dia, mexendo nas coisas dele, vi que o Jayme tinha um encontro com uma pessoa, se não me engano, no bairro de Piedade no Rio de Janeiro. Neste encontro, deveria encontrar-se com um cidadão que iria preparar um documento para ele, pois precisava sair da cidade devido problemas na gráfica. Ele não podia ficar mais ali”, relatou a esposa do jornalista, em depoimento registrado pela Secretaria do Governo alagoano.  .

Jayme Miranda

Nascido em 18 de Julho de 1926, O jornalista Jayme Miranda foi um dos onze membros do Comitê Central do PCB assassinados pela ditadura militar na década de 1970. Miranda foi seqüestrado em 1975, no Rio de Janeiro, onde exercia atividades clandestinas, sendo membro da executiva nacional do partido.   Em sua atuação na imprensa, Miranda o jornalista atuou como revisor no Jornal de Alagoas, empresa do grupo Diários Associados, e em A Notícia entre 1941 e 1945.

Tendo atuado em outros estados, Miranda teve seu nome citado recentemente na Comissão da Verdade do Pará como sendo um dos grandes nomes da luta popular nos anos de chumbo.

Comissões da Verdade em Alagoas

No estado existem quatro CVs, a mais recente, instituída pelo Governo do Estado, tem buscado ouvir testemunhas da época, embora apenas duas sessões públicas para ouvir as testemunhas tenham sido realizadas.

Na Universidade Federal de Alagoas, UFAL, há uma comissão montada pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE), que tem realizado trabalhos de conscientização dos estudantes de hoje para evitar que essas histórias voltem acontecer.

Há ainda a comissão da verdade instituída pelo Sindicato dos Petroleiros de Alagoas e Sergipe, que tem investigado crimes cometidos pelos militares contras os membros da categoria nos dois estados, embora muito pouco tenha sido divulgado.
                                                               
Foto de 2005 mostra a família de Miranda
A comissão que está com os trabalhos mais avançados é a do Sindicato dos Jornalistas de Alagoas, Sindjornal, que já ouviu muitas pessoas, entre eles o advogado Mendes de Barros, ex-procurador da Assembleia Legislativa do Estado de Alagoas, que defendeu presos políticos no Estado e foi perseguido por isso. “Uma vez os militares cercaram a minha casa e tentaram me prender sob a acusação de contrabando de bebida, já que eu tinha em casa uma caixa de whisky”, disse o advogado. (Com TNHl)


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