Coronel revela como sumiu com corpo de Rubens Paiva


             

Após 43 anos do desaparecimento do deputado federal Rubens Paiva, o coronel reformado Paulo Malhães, de 76 anos, admitiu pela primeira vez que foi um dos chefes da operação montada em 1973 para sumir com o corpo do político, que estava enterrado na Praia do Recreio dos Bandeirantes. Considerado um dos mais atuantes agentes do Centro de Informações do Exército (CIE) nos anos de chumbo, ele diz que teve a missão de encontrar o corpo e desaparecer com ele de vez.
“Recebi a missão para resolver o problema, que não seria enterrar de novo. Procuramos até que se achou (o corpo), levou algum tempo. Foi um sufoco para achar (o corpo). Aí seguiu o destino normal”, disse à reportagem do jornal O Dia.

Para localizar o corpo de Rubens Paiva, duas equipes trabalharam durante cerca de 15 dias na praia. Junto com Malhães, também participou da missão o coronel reformado José Brant Teixeira, parceiro de diversas outras operações. Além dele, os sargentos Jairo de Canaan Cony e Iracy Pedro Interaminense Corrêa. Apenas Cony está falecido.

O oficial admite que sabia de quem era o corpo procurado. “Eu podia negar, dizer que não sabia, mas eu sabia quem era sim. Não sabia por que tinha morrido, nem quem matou. Mas sabia que ele era um deputado federal, que era correio de alguém”, conta.

Malhães diz ter recebido a missão do próprio gabinete do ministro do Exército em 1973. Ele diz que estava investigando uma guerrilha no sul do Brasil durante a prisão do deputado e só ao receber a missão é que foi informado de que o corpo tinha sido inicialmente enterrado em 1971 no Alto da Boa Vista.

Na ocasião, os militares temiam que obras na Avenida Edson Passos acabassem revelando o cadáver. Então, o corpo foi retirado do local no mesmo ano e novamente enterrado na Praia do Recreio dos Bandeirantes. Em 1973, o coronel conta que o CIE resolveu dar uma “solução final”.

“A preocupação foi aquela velha briga. Foi o negócio de enterrar. Eles enterram o cara, tiraram cara do lugar que estava enterrado que era no Alto da Boa Vista porque ia passar na beira de um estrada. Aí, tiraram o cara e levaram para o Recreio e enterraram na areia. Só que a Polícia do Exército (PE) quase toda viu isso. Esse translado”, explica.
De acordo com Malhães, O Exército avaliava que a operação era necessária porque alguns agentes do DOI-Codi ameaçavam tornar o caso público.

Rubens Paiva foi preso em casa no dia 20 de janeiro de 1971 por agentes do Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (Cisa). Horas depois, o deputado foi entregue ao DOI-Codi, no Rio, onde foi torturado até a morte. 

Deputado federal, eleito pelo PTB, mesmo partido de João Goulart, Rubens Paiva foi cassado em 1964, logo após o golpe militar. Após um período no exílio, retorna ao Brasil, mantendo suas atividades empresariais. Sua morte se deu em 21 de janeiro de 1971 e uma farsa foi montada para ocultar o crime. Seu corpo nunca foi encontrado.

“Rubens Paiva, calculo, morreu por erro. Os caras exageravam naquilo que faziam, sem necessidade. Ficavam satisfeitos e sorridentes ao tirar sangue e dar porrada. Isso aconteceu com Rubens Paiva. Deram tanta porrada nele que, quando foram ver, já estava morto. Ai ficou o abacaxi, o que fazer? Se faz o que com o morto? Se enterra e se conta este negócio do sequestro. Só que o cara, primeiro, enterrou na estrada que vai para o Alto da Boa Vista. Aí, estavam fazendo a beirada da estrada, cimentando, e o cara viu que eles iam passar por cima do corpo. Foi lá e tirou”, disse em depoimento à Comissão Estadual da Verdade (CEV).

Sobre o destino do corpo de Paiva, Malhães disse ao jornal O Globo que o lançou no mar. À Comissão da Verdade do Rio (CEV), contou que o destino do ex-deputado foi o mesmo rio no distrito de Itaipava onde foram jogados as vítimas da Casa da Morte, um centro de tortura instalado pelo militares no município de Petrópolis, Região Serrana do Estado Rio de Janeiro. Os corpos dos desaparecidos políticos foram atirados em um rio no distrito de Itaipava e, para evitar a identificação, as arcadas dentárias e os dedos das mãos eram retirados.

“Jamais se enterra um cara que você matou. Se matar um cara, não enterro. Há outra solução para mandar ele embora. Se jogar no rio, por exemplo, corre. Como ali, saindo de Petrópolis, onde tem uma porção de pontes, perto de Itaipava. Não (jogar) com muita pedra. O peso (do saco) tem que ser proporcional ao peso do adversário, para que ele não afunde, nem suba. Por isso, não acredito que, em sã consciência, alguém ainda pense em achar um corpo.”

Com informações do jornal O Dia e O Globo. (Com a ABI)

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