NÃO ME FALEM DE POLÍTICA


Hermínio Prates (*)

Estou enojado da política. Da política não, pois essa é a arte da conciliação, como já dito e muito repetido, até pelo torneiro mecânico que desagradou os bacanas no encerramento do segundo mandato com 87% de aprovação. Não, não estou enojado da política e sim dos políticos, dos sevandijas que negam mérito a quem deu vez e voz aos sem tino e destino. Sabem a quem me refiro? Aos que sugam as tetas pátrias sob os mais descarados disfarces, mesmo que para isso usem o bico dos tucanos, uma ave predadora, mas que é apenas uma ave, embora não cante como o sabiá e nem arrulhe como pombas da paz. Saibam todos que o tucanismo de hoje, irmanado com os demos, são sucedâneos dos pefelistas, arenistas, udenistas, escravocratas e, se a gente mergulhar mais no passado vai esbarrar até na inquisição, que é coisa do capeta, mas foi muito usada por eles e para eles. Eles quem? Ora, os donos do poder, sejam com mantos da nobreza ou santas tiaras dos santos homens que vicejam entre os que podem. E os que podem, geralmente fedem.
Outro dia tive a ingrata lembrança de ouvir, em prosa de rádio, que Adhemar de Barros (1901-69) foi o inspirador da prática e do slogan “rouba, mas faz”. Pura maldade com o paulistão. O selo inicial da obra adhemarista era “São Paulo não pode parar”. E não parou mesmo, tanto que a corrupção oficial deu filhotes. Décadas depois, eis que brota do lodo do mau empresariado um Paulo Maluf de espertezas mil, que até hoje jura por Ali Babá que não sabe de nenhuma caverna de tesouros em paraísos fiscais e nem dos 40 ladrões da sua grei.
Roubar, mas fazer, é uma justificativa? Paulo Maluf se apoderou do slogan, aprimorou a prática e legou aos sucessores a obra do mal feito no Brasil que os quatrocentões chamam de resto. Então que se multipliquem os buracos nos metrôs paulistanos, as manipulações na Codemig, as obras faraônicas nas beiradas da capital mineira, os escândalos abafados pela família Rigotto nos pampas, o ranário de Jader Barbalho, as muitas coisas do clã Sarney e, que diabos, as tantas safadezas que a mídia comprada por verbas públicas escamoteia.
Ainda sobre o velho Adhemar. Os políticos de hoje o consideram um simplório, pois apesar da fama não teria amealhado o que hoje qualquer prefeitinho de cidade média esconde. Dizem que Adhemar pouco tinha além dos pouco mais de U$ 2,5 milhões que estavam no tal cofre escondido no apartamento da secretária-amante e que foi confiscado por um comando revolucionário. Com a correção, o botim seria hoje algo em torno de 15 milhões de dólares, uma mixórdia para os piratas de hoje.
Como diria o tido como santo Ruy Barbosa (1849-1923), às vezes dá vergonha de ser tão crédulo. Esclareço que nada tenho contra a Bahia, os baianos e as baianas. Sou amigo de muitos devotos do Senhor do Bonfim e amei incontáveis outras devotas de Iansã. É que o Ruy cabeção quase abdicou de ser baiano, preferiu ser um homem da corte em busca do poder. Uma espécie de Marina Silva, entendem? Também se candidatou à Presidência, arrotando um discurso de moralidade, como se fora um doutor Enéas escapo da máquina do tempo. Qual a proximidade entre os dois? Ora, Marina se poluiu com a aproximação dos tucanos da paulicéia desacreditada e o Ruy, ora o Ruy, ele, entre muitos pecados e escorregadelas, até advogou causas do abutre Percival Farquhar (1864-1953) contra os interesses pátrios. Quem foi Farquhar? Apenas um aventureiro nascido em Nova York que corrompeu e/ou engambelou o governo brasileiro e se transformou em um mal intencionado Irineu Evangelista de Sousa (1813-1889), primeiro e único barão e visconde de Mauá, um empreendedor à moda antiga que se deixou iludir pelas pompas e salamaleques dos nobres que proliferavam nos corredores da corte.
Não, reconheço que a comparação não é justa com o barão. Ele foi mais um idealista do que trampolineiro. O “empreendedorismo” de Farquhar se aproxima mais de Eike Batista, esse menino de ouro, cuja pepita inicial na enorme montanha de riquezas ninguém sabe de onde surgiu. Terá sido faiscada pelas pesquisas da Vale do Rio Doce, quando esta ainda era uma empresa pública e gerida pelo zeloso papai Eliezer Batista? Quem sabe? Sobre isso sobram maledicências, mas o “me contaram” é terreno perigoso e não ouso atrair a gana de nenhum advogado demandista juramentado.
Dizem que foi assim: o menino vivia na Alemanha, onde não foi capaz de concluir o curso de engenharia. Aí veio para o Brasil e começou a brincar de intermediar a venda de diamantes, o que alguns chamam de contrabando. Agiu do mesmo modo com o ouro e com o tempo, arrancou um capital de 500 mil dólares de receptadores internacionais, que se transformaram em seis milhões. Em curto prazo os milhões se acumularam. Milagre? De jeito nenhum. É que em todas as empresas ele dava um jeito de enfiar um X no nome e o X, explicou o Midas, “representa a multiplicação, acelera a criação da riqueza”. Simples assim e garantem que sem nenhuma correlação com a nunca explicada acusação do uso de informações privilegiadas oriundas da estratégica posição do papai no governo, antes e depois do golpe militar.
O X está tão entranhado na vida do Eike que a letra até transferiu a eufonia para o som do ch que redundou em um tremendo chifre, por iniciativa da siliconizada Luma de Oliveira em parceria com um anônimo sargento do Corpo de Bombeiros. Mas isso foi apenas um detalhe, pois quem é do andar de cima não coça a piolhenta. Afinal, Eike assumiu a Luma uma semana antes de se oficializar com a socialite Patrícia Leal, com quem já casara no religioso. Aí a igreja católica anulou o ato e Patrícia se casou com Antenor Mayrink Veiga, por sinal ex-namorado da Luma. Mas não foi essa mesma igreja que não quis anular o primeiro casamento de Henrique VIII, o que provocou aquele racha gerador da igreja anglicana?
Deixemos no limbo os eventos de lençóis e travesseiros e, para encerrar, pespego no livre pensar do amigo leitor: o enaltecido Ruy Barbosa não teria sido alguém como o prepotente ministro Gilmar Mendes, aquele que no meio da noite libertou o “puro” Daniel Dantas, o Opportunity empresário das maracutaias privativistas?

(*) Hermínio Prates é jornalista
herminioprates@ig.com.br.

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