A QUESTÃO DO ABORTO


José Carlos Alexandre


Vou enfocar uma questão das mais polêmicas no texto do decreto no. 7.037, de 21 de dezembro de 2009 que trata do Programa Nacional de Direitos Humanos. A questão do aborto.
Por ocasião da 3a.Mostra Cinema e Direitos Humanos, realizada em BH no período de 28/10 a 2/11/2008, em BH, ao término de uma das sessões, grupo de mulheres, braços erguidos, gritavam palavras-de-ordem em favor do aborto, sob justificativa: “Nós é que parimos”!
Dois anos depois, num outro contexto, o XIV Congresso Nacional do PCB, realizado no Rio de Janeiro, em novembro passado, também encontrei a bancada feminina organizada, em defesa do direito ao aborto.
E ai um fato curioso: elas foram derrotadas ao cabo da contagem final de votos, na antevéspera de encerramento do Congresso...O tema, abordado com bastante competência nas teses em discussão desde maio no Partido, não foi aprovada...
Com base nas manifestações femininas citadas, passei a encarar a seriedade da tese e defendê-la, a despeito do que possam pensar e divulgar as igrejas e suas organizações.
Mesmo porque elas foram discutidas à exaustão por conferências de entidades da sociedade civil em todas as regiões mineiras , na Conferência Estadual, realizada na ALMG, e na 11ª. Conferência Nacional, realizada em Brasília em dezembro de 2008, aberta com a presença do presidente da República.
Ademais, o Programa Nacional de Defesa dos Direitos Humanos-3, objeto do decreto 7037 de 21 de dezembro de 2009, passou a contemplar as propostas oriundas das diversas instâncias onde a questão foi debatida.´
Um ligeiro parêntese:o jornalista Ramiro Batista, em seu livro "O Dossiê Rubicão", misto de ficção e verdade, lembra em sua página 165 que a sexóloga Marta Suplicy, àquela época, mantinha pelas manhãs, um programa matinal, o TV Mulher, da Rede Globo onde "abrira uma cruzada nacional pela legalização do aborto, como forma de amenizar a tragédia de 3 milhões de abortos clandestinos a cada ano no país". O livro aborda a política brasileira em 1985.
Dados do Centro de Mídia Independente, CMI, apontam a seriedade da questão:"Estima-se que em todo o mundo 46 milhões de gravidezes terminam em abortamento a cada ano. Destes 46 milhões, 20 milhões (44%) são abortamentos feitos de forma clandestina. As informações estão no documento Abortamento Seguro: Orientação Técnica e de Políticas para os Sistemas da Saúde (OMS/ 2003, também disponível em http://portugues.iwhc.org/docUploads/WHO%20Guidance.%20Cap1-4.doc)
Estudos do Instituto Alan Guttmacher (IAG, em www.agi-usa.org) informam que nos países em desenvolvimento ocorrem 182 milhões de gestações anuais. Estima-se que 36% dessas gestações não foram planejadas, entre as quais 20% terminam em aborto. A América Latina e o Caribe contribuem significativamente para estes números. As estimativas feitas pelo IAG apontam que, a cada ano, são realizados cerca de 4 milhões de abortos clandestinos e inseguros nas duas regiões.
A Organização Mundial de Saúde divulgou dado sobre mortes maternas relacionadas ao aborto. Segundo a OMS, 21% das mortes (cerca de 6 mil/ano) relacionadas com a gravidez, o parto e o pós-parto, nesses países, têm como causa as complicações do aborto realizado de forma insegura.
Segundo o documento Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, publicado pelo Ministério da Saúde em março de 2004, no Brasil 31% de gestações terminam em aborto. Anualmente, ocorrem no país aproximadamente 1,4 milhão de abortamentos, entre espontâneos e inseguros, com uma taxa de 3,7 abortos para 100 mulheres de 15 a 49 anos.
Ainda segundo o documento, em 2002 foram registrados 53,77 óbitos maternos por 100 mil nascidos vivos, devido a complicações na gestação, no parto ou no puerpério (período de 42 dias após o parto).
Entre as principais causas dessas mortes, destacam-se a hipertensão (13,3%), hemorragia (7,6%), infecção puerperal (3,9%) e aborto (2,7%).
No entanto, o documento faz uma importante ressalva: para a Área Técnica de Saúde da Mulher, os casos de mortes por abortamento podem ter sido maiores, já que muitas vezes as complicações decorrentes do aborto são registradas como hemorragias e infecções, o que pode camuflar as estatísticas do abortamento.
Dados do SUS indicam que em 2004 foram realizados 1.600 abortos legais em 51 serviços especializados do SUS ao custo de R$ 232 mil. No mesmo ano, ocorreram no SUS 244 mil internações motivadas por curetagens pós-aborto? entre estes abortamentos espontâneos ou voluntários e feitos na clandestinidade - orçadas em R$ 35 milhões.
As curetagens são o segundo procedimento obstétrico mais praticado nas unidades de internação, superadas apenas pelos partos normais. Segundo a ANDI (Agência de Notícia dos Direitos da Infância), a cada dia cerca de 140 meninas têm a gravidez interrompida.
A cada hora, seis adolescentes entram em processo de abortamento." (CMI)
Vê-se, portanto, que o Fórum Permanente em Defesa do PNDH-3 tem razão ao defender a tese do aborto e dos demais pontos ,ditos polêmicos, do decreto 7.037 de 21 de dezembro de 2009.
Se, ao contrário de se curvar à exigência dos setores mais conservadores e reacionários do país, na primeira grande crise militar do governo petista, tão grave quanto a de 1964, os governantes buscassem o apoio popular, não estaríamos aqui a novamente levar a sociedade a discutir todas as resoluções adotadas nas conferencias realizadas em todo o país.
Fica a lição: o povo tem de pressionar sempre para que suas reivindicações sejam levadas a sério. Pelo menos até que conquiste efetivamente o poder.
(Baseado em minha última intervenção na plenária do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos de Minas Gerais, onde acrescentei que o aborto, como questão polêmica, deve ser um direito fundamental da mulher, qual seja, o uso do próprio corpo)
Principal fonte: Google.

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